Em 2002, após um retumbante fracasso amoroso e a consequente depressão, eu decidi voltar a morar em minha cidade, no sertão do Ceará, após 12 anos morando em Recife. Era mais que óbvio que eu não iria me adaptar ao local depois de tanto tempo, mas não havia muita alternativa, pois eu precisava descansar e pensar muito no que eu ia fazer da minha vida.
O tempo foi passando e eu ficando. Gostava de ter meus irmãos por perto, de ver meus sobrinhos nascerem e crescerem, de passar mais tempo ao lado dos meus pais. Só que o tal fracasso amoroso não saía da minha cabeça, eu tinha que exorcizá-lo de alguma forma, e a única forma que eu podia usar, naquele momento, era escrever.
Iniciei um romance com a seguinte premissa: um dia, um sujeito acorda extremamente deprimido, mas não tem a mínima idéia do motivo. Os dias iam passando e o sujeito só fazia piorar, deteriorava-se a olhos vistos. Até que um velho amigo aparecia e forçava o personagem principal a reagir, nem que fosse na porrada. Mas nada dava certo, pois o que mais afligia o sujeito era não saber o motivo de tal sentimento. Nem quando ele havia começado, ele lembrava. Até o momento em que, inadvertidamente, ao meter a mão dentro do sofá para pegar o último pedaço de biscoito que estava comendo, ele encontra um papel amassado, um cartão de um psiquiatra. A história seguia e o nosso herói descobria que havia sido submetido a um tratamento experimental, que havia apagado, seletivamente, todas as memórias relacionadas a um caso de amor fracassado :)
Familiar, não? Pois é…
Em 2005, três anos depois, com umas 250 páginas escritas (primeiro tratamento!), eu fui surpreendido por um filme chamado “brilho eterno de uma mente sem lembranças”. Ao terminar de ver, pensei: Putaqueopariu3vezes! Que filme bom pra caralho!
Só que, PQP, detonou o meu romance! Se eu o terminasse, a primeira coisa que iriam pensar ao lê-lo seria: cópia descarada de “brilho eterno…”! :/ Travei e praticamente não escrevi mais nada, o romance está parado até hoje, quase 8 anos depois.
Após este pequeno introito, explico.
“Cold Souls” é um filme que acabei de ver, estrelado pelo Paul Giamatti, ator de minha simpatia por diversos filmes, incluindo “Sideways”, “Anti-Herói Americano” e “StoryTelling”. A sinopse é simples: o ator Paul Giamatti (como ele mesmo!), após desgastantes ensaios da peça “Tio Vânia” de Chekov, decide que não tem mais condições de atuar, pois é um papel devastador, que está levando seus nervos, sua existência, a um limite impensável de desgaste.
O agente de Giamatti, muito en passant, sabendo da crise dele, comenta sobre um artigo na revista “new yorker” sobre uma clínica onde se pode “armazenar sua alma”, isto é, quem estiver se sentindo muito torturado, pode ir até lá e arrancar a própria alma e depositá-la em um cofre.
Pensei: ah, pode ser legal, não acredito que um filme com um conceito tão próximo do “brilho eterno…” (e da porcaria do meu romance) tenha sido feito por alguém como o Giamatti sem o devido distanciamento, sem um novo enfoque.
Enganei-me.
Basicamente, é uma tentativa de repetir o “brilho eterno…”, meio alquebrada, meio engembrada, meio gambiarra…
Só que ao invés de recolher, retirar, memórias, o que se arranca é a “alma”, o que quer que ela seja, como salienta o médico (o sempre austero David Strathaim).
Fiquei pensando, enquanto via esta parte, em Descartes, em Platão, em Hume… no que era memória, no que seria alma, em qual seria a relação entre as duas coisas se a alma existisse… tudo isto acontecendo na minha cabeça porque o filme era chatíssimo, onde o outro filme é poético, lírico, lindo de se ver, este é morgante, repetitivo, sem graça.
Não entendi porque o Giamatti topou, talvez por ego, afinal, ele, PAUL GIAMATTI, estava ali, mostrando a si mesmo… assim como eu estou aqui, lá em cima, mostrando a mim mesmo… :/
Há algo de bom no filme? Talvez alguns diálogos, alguns monólogos, alguns silêncios (hehehe)… falaram muito pela net que o desempenho de Giamatti está excepcional, trágico e cômico em perfeição... não achei ruim, mas não é uma excelente atuação que salva um filme desastrado.
É claro que a minha impressão pode estar totalmente contaminada por minha experiência ruim contada acima, mas não creio que seja o caso, é um desperdício de película este filme, não o veja. Não é horrível, mas é dispensável. Nem vou colocar o link aqui, pra não incentivar ninguém.
Ao fim, fico pensando no meu velho romance… se “Cold Souls” foi filmado, por que eu não posso terminá-lo, na cara dura, sem estar nem aí para quem me encher o saco com comparações a “brilho eterno…”?
Não sei.
O tempo dirá!
Cabeção, termina a porra do romance. Eu faço a capa - e não vai ficar emo! E quanto a "brilho eterno(...)", porra, é um filme muito foda. Vou assistir a este, tem lá no topdezfilmes.
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